No universo da medicina do trabalho, a dúvida sobre os exames para atividades de risco é constante. É preciso solicitar EEG e ECG para todos os colaboradores em trabalho em altura ou espaços confinados? Para responder, é preciso entender o que as NRs e as diretrizes médicas realmente exigem.
Com base nas Normas Regulamentadoras (NRs) e nas diretrizes da Associação Nacional de Medicina do Trabalho (ANAMT), vamos esclarecer o que é mito e o que é fato nessa questão.
Afinal, os Exames Complementares São Obrigatórios?
A resposta direta é: não. A realização de exames complementares como EEG e ECG não é obrigatória para a liberação de funcionários para atividades de risco. As Normas Regulamentadoras que abordam essas atividades — NR 10 (Eletricidade), NR 33 (Espaços Confinados) e NR 35 (Trabalho em Altura) — não citam a obrigatoriedade de nenhum exame complementar específico.
O que as NRs exigem é uma avaliação médica específica para a função a ser desempenhada. Isso significa que o foco principal não está em uma lista de exames, mas sim em uma avaliação clínica detalhada e direcionada.
O Papel do Médico do Trabalho e do PCMSO
A decisão de solicitar ou não um exame complementar é de responsabilidade do médico responsável pelo Programa de Controle Médico de Saúde Ocupacional (PCMSO) da empresa. Esses exames podem ser indicados a critério médico, principalmente em duas situações:
- Quando há suspeita clínica: Se, durante o exame ocupacional, o trabalhador relatar sintomas como tonturas, desmaios, palpitações, ou se houver suspeita de patologias cardíacas ou neurológicas, o médico pode solicitar um ECG, EEG ou qualquer outro exame para investigar o caso.
- Acompanhamento de doenças pré-existentes: Para monitorar patologias já confirmadas e verificar se estão devidamente controladas.
É fundamental diferenciar o uso de um exame para diagnóstico (quando há suspeita) do seu uso para rastreamento (aplicado em massa em pessoas sem sintomas). As diretrizes médicas não recomendam o rastreamento em massa com esses exames.
O Que Diz a ANAMT sobre o Rastreamento com EEG e ECG?
A Associação Nacional de Medicina do Trabalho (ANAMT) possui diretrizes técnicas claras que desaconselham o uso de EEG e ECG para rastreamento em trabalhadores assintomáticos.
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EEG para Rastreamento de Epilepsia: A ANAMT não recomenda o uso do EEG para rastrear epilepsia na prática da medicina do trabalho. A justificativa é a baixa sensibilidade do exame (entre 20% e 55% em um único exame) e o alto número de resultados falso-positivos, que podem levar a decisões equivocadas e desviar recursos. Um EEG anormal em uma pessoa sem sintomas tem uma probabilidade de até 99,8% de estar errado.
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ECG para Rastreamento de Cardiopatias: Da mesma forma, a ANAMT não recomenda o uso do ECG de repouso como ferramenta de rastreamento em população adulta e assintomática. Não existem evidências científicas que comprovem que essa prática previna acidentes, síncopes ou morte súbita no ambiente de trabalho. A sugestão de conduta que indicava o ECG para trabalho em altura foi, inclusive, revogada em 2015 por falta de embasamento científico.
Qual é o Foco da Avaliação Médica para Atividades de Risco?
Se os exames não são o ponto principal, o que é? A avaliação deve ser centrada em uma anamnese e exame físico completos, com ênfase em patologias que possam originar um mal súbito. O médico deve investigar:
- Sintomas atuais e passados: Tonturas, vertigens, desmaios, palpitações, falta de ar, dor torácica e cansaço fácil.
- Fatores psicossociais: Medo de altura ou de locais fechados, sintomas de ansiedade e nervosismo.
- Doenças crônicas: Avaliação e controle de condições como diabetes, pressão alta, cardiopatias, epilepsia e patologias psiquiátricas.
Um trabalhador será considerado inapto se apresentar patologias descompensadas com risco de mal súbito, epilepsia com histórico de convulsões há menos de um ano (mesmo em tratamento), ou dificuldades visuais e auditivas significativas.
Conclusão
A aptidão para o trabalho em atividades de risco é determinada por uma avaliação médica criteriosa e individualizada, e não pela realização indiscriminada de exames complementares. O EEG e o ECG são ferramentas valiosas para a investigação diagnóstica quando há uma suspeita clínica, mas seu uso como rastreamento em massa não é suportado pelas evidências científicas nem pelas diretrizes das principais entidades de medicina do trabalho no Brasil. A prioridade deve ser sempre um PCMSO bem estruturado e uma avaliação clínica de alta qualidade.
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